Foto: Vinicius Becker (Diário)
Famílias que precisam sepultar seus entes em Santa Maria têm enfrentado dificuldades por falta de espaço nas carneiras (gavetas para sepultamento) do Cemitério Ecumênico Municipal. O problema ocorre porque o número de unidades disponíveis chega, em alguns períodos, a apenas 30. No total, o cemitério possui 3.860 carneiras. Segundo a prefeitura, mais de 20 mil ossadas humanas estão armazenadas no local sem destinação final, o que obriga a administração a contatar familiares para a retirada dos restos mortais e liberar novas vagas. (Entenda mais abaixo como funciona as carneiras)
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A administração do Ecumênico aponta que já foi necessário ligar para uma pessoa para providenciar a exumação para poder enterrar outra. Em função disto, na última semana, a prefeitura publicou uma convocação aos responsáveis por sepultamentos realizados em 2020. A medida busca disponibilizar novas unidades e atender à demanda por enterros que segundo a administração, é uma preocupação. Conforme relatos de servidores, "já aconteceu de não ter onde colocar as pessoas" .
O prazo final para realizar a retirada dos sepultados em 2020, que completaram os três anos ou mais, vai até 12 de novembro e segue o Código de Posturas do município, que prevê a permanência máxima deste período nas carneiras. Caso os familiares não compareçam, os restos mortais são retirados e encaminhados aos ossários coletivos – que estão superlotados.
Apesar da identificação correta das ossadas e armazenagem em sacos apropriados, o cenário verificado pela reportagem mostra improviso. Uma antiga sala de escritório e baús de caminhão – ambos fechados – foram adaptados para o armazenamento. "A gente consegue dos caminhão que vão ficando velho. Tipo de caminhão que fica em desuso, que vai para Sucata.".
Em nota, a Secretaria de Serviços Públicos afirma que “as ossadas estão acondicionadas em contêineres fechados, além de salas destinadas para esse fim” e informa que estuda, junto a órgãos sanitários e jurídicos, “quais medidas cabíveis devem ser adotadas às ossadas não reclamadas”.

Futuro incerto
No Bairro Caturrita, o Cemitério Municipal Jardim da Saudade deve amenizar parcialmente a crise, mas as 100 novas carneiras previstas só devem ser concluídas no primeiro semestre de 2026, dependendo das condições climáticas, segundo a prefeitura. O futuro, porém, ainda é incerto, já que não há projetos para novos cemitérios na cidade – apenas para ampliação dos já existentes. A medida, no entanto, é vista pelos responsáveis pelo Ecumênico como paliativa.
– Ajuda, mas em períodos como novembro ou dezembro, que são meses em que ocorrem muitos acidentes, a gente já tem essa estatística. É um mês que possivelmente enche as 80 lá e deu. Por isso, estamos sempre precisando de espaço – conclui uma servidora do Ecumênico que pediu para não ser identificada.
O que pode aliviar parcialmente a situação é o aumento da cremação. Segundo a prefeitura, entre 10% e 20% das pessoas têm optado por esse procedimento, o que ajuda a desafogar o sistema. Ainda assim, o percentual é considerado baixo, já que a maioria das famílias continua escolhendo o sepultamento tradicional por motivos religiosos ou financeiros. Por isso, a superlotação não teve mudança efetiva, embora o número de cremações esteja em crescimento.
Entenda como funcionam as carneiras no Cemitério Municipal

A superlotação do Cemitério Ecumênico Municipal levantou uma série de dúvidas sobre o funcionamento das "carneiras", as gavetas para sepultamento. Com base na legislação do município e em informações da administração do cemitério, o Diário preparou um guia para esclarecer os principais pontos.
- O que são e como funcionam?
Diferentemente dos jazigos, que são propriedades perpétuas da família, as carneiras são espaços públicos arrendados (alugados) por um tempo determinado. O arrendamento é anual e as taxas são estabelecidas por decreto da prefeitura. No momento do sepultamento, a família já paga o valor referente aos três primeiros anos.
- Qual o prazo de permanência?
De acordo com o Código de Posturas do Município e a legislação sanitária federal, o tempo máximo de permanência de um corpo na carneira é de três anos. Após este período, a família pode ser notificada para realizar a exumação (retirada dos restos mortais).
- Por que o prazo pode ser maior?
Embora o prazo legal seja de três anos, a decomposição completa pode levar mais tempo, dependendo de fatores como o uso de medicamentos (quimioterapia, por exemplo) pelo falecido. Em alguns casos, a exumação só é possível após cinco, seis ou até 10 anos. Nestas situações, o arrendamento da carneira é renovado anualmente até que o procedimento seja viável.
- Como é feita a notificação para a exumação?
A administração do cemitério primeiro tenta o contato por telefone. Caso não obtenha sucesso, a lei municipal determina que a família seja notificada por correspondência com Aviso de Recebimento (AR) e por meio de um edital publicado em um jornal de grande circulação, com o nome do falecido. A partir da publicação do edital, a família tem 30 dias para se manifestar.
- O que acontece se a família não for encontrada?
Após esgotadas todas as tentativas de contato e vencido o prazo legal de 30 dias do edital, a administração do cemitério realiza a exumação. Os restos mortais são acondicionados em uma embalagem própria, devidamente identificados com nome, data do óbito e número da carneira original, e armazenados no ossário coletivo do cemitério, onde ficam à disposição caso a família procure futuramente.
- Quais os custos envolvidos?
As tarifas de arrendamento e serviços como exumação e inumação são fixadas anualmente pela prefeitura. O Código de Posturas do Município também prevê a possibilidade de sepultamento gratuito para pessoas reconhecidamente pobres, a critério da administração municipal.